segunda-feira, 10 de abril de 2017

Mais um crime de Guerra

Pio Penna Filho*

Mais um crime de guerra cometido no conflito da Síria, dessa vez com a utilização de armas químicas contra alvos urbanos. Cerca de cem mortos e centenas de feridos. Muitas crianças dentre os mortos. São cenas horrorosas, que só reforçam a bestialidade da guerra.
Armas químicas já foram usadas em outras ocasiões na guerra da Síria. Em todas elas houve uma espécie de comoção internacional. Mas uma comoção que não mudou nada na terrível realidade da guerra no país. Tanto é assim que armas químicas voltaram a ser empregadas, e mais de uma vez.
Não se sabe ao certo quem as utilizou dessa feita, se o governo do ditador Assad (suspeito mor), ou se os insurgentes que lutam contra o governo. No fundo essa questão não importa tanto. O que importa é que estão usando armas terríveis contra a população civil e o mundo está impotente diante das atrocidades que estão em andamento.
Os Estados Unidos ameaçaram tomar iniciativa unilateral caso a ONU nada faça. Mas é mais uma bravata de um ator que também tem muita culpa no cartório. Aliás, Estados Unidos, Inglaterra, França, Rússia, Irã, dentre outros, estão com suas bandeiras nacionais manchadas com o sangue sírio.
A ONU está praticamente inoperante na questão da guerra síria, com o Conselho de Segurança paralisado. O apoio da Rússia foi decisivo para mudar a maré da guerra e acabou por consolidar a ditadura de Assad. Com a Rússia em campo os americanos não podem fazer muita coisa, essa é a realidade. Qualquer ação militar por parte de Washington poderá levar a uma escalada ainda mais perigosa na guerra da Síria.
Infelizmente as armas químicas são uma realidade perturbadora. Elas já foram usadas em diversas outras ocasiões e por outros atores. A Alemanha foi o primeiro país a utilizá-las no mundo contemporâneo, em 1915, durante a Primeira Guerra Mundial. Depois voltaram a utilizá-la na insana política racial praticada durante a Segunda Guerra, mas dessa vez nos campos de extermínio, não contra outro exército, mas sim contra judeus e outras “minorias” odiadas pelos nazistas.
Os americanos também usaram armas químicas na guerra do Vietnã, com consequências que se prolongam até os dias atuais. O Iraque de Saddam Hussein as utilizou em pelo menos duas ocasiões: contra os curdos, no Norte, e contra os iranianos, na guerra Irã-Iraque. Além de países, grupos terroristas também já fizeram utilização de armas químicas, como os ataques com gás sarin (o mesmo utilizado recentemente na Síria) em Tóquio, em 1995. 
Existem estoques em abundância de armas químicas mundo afora. Não apenas países pobres possuem esse tipo de arma. Países poderosos como Rússia e Estados Unidos também fazem parte dos detentores dessas armas. Um dos grandes problemas é que é muito difícil controlar ou limitar a produção desse tipo de armamento.
Enfim, estamos diante de mais um brutal episódio envolvendo ataque com arma química, e com o agravante de ter sido empregada em ambiente urbano, por um governo contra o seu próprio povo. Pior que isso só mesmo a impotência da comunidade internacional para lidar com um conflito que já ceifou a vida de milhares de pessoas e que está impondo um sofrimento sem fim a tanta gente. 






* Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com