segunda-feira, 22 de abril de 2013

Terrorismo nos Estados Unidos


Pio Penna Filho*

Enquanto a Coreia do Norte faz ameaças atômicas, um novo atentado terrorista deixa os norte-americanos ansiosos. A cidade da vez foi Boston, mas poderia ser qualquer outra, maior ou menor. O fato é que o número de descontentes com as atitudes de sucessivos governos norte-americanos não para de crescer e, entre eles, há gente disposta a tudo, mesmo que para atingir os seus objetivos políticos pessoas inocentes tenham que sofrer e morrer.
A resposta tem sido invariavelmente a mesma, isto é, ações de retaliação que usam a força e a violência. Aliás, na maior parte das vezes a resposta dos Estados Unidos é absurdamente desproporcional e indiscriminada. Assim, muitas outras pessoas inocentes acabam se tornando vítimas do emprego de métodos tão abomináveis quanto aqueles praticados pelos terroristas. A diferença básica é que o terrorismo de Estado costuma ser mais digerível e tolerado do que o de grupos radicais.
É preciso prestar mais atenção à retomada do terrorismo no período do pós-Guerra Fria, ou seja, a partir do fim da União Soviética e do desmoronamento do mundo do socialismo real. Embora o terrorismo seja muito mais antigo, foi no final da década de 1990 que as suas ações se tornaram mais intensas.
O incremento do terrorismo tem a ver com a postura dos Estados Unidos em termos de política internacional. Esse, pelo menos, é um dos principais argumentos utilizados por alguns dos mais expressivos movimentos que publicamente assumem o terrorismo como forma de luta política. E, de fato, não se trata de um argumento fraco.
É importante ponderar, entretanto, que não se deve transformar a vítima em culpado, como uma leitura superficial do argumento pode sugerir. Não se trata, portanto, de aceitar passivamente a justificativa daqueles que praticam o terrorismo. Mas é preciso refletir porque o terrorismo acontece nos Estados Unidos e em alguns outros poucos países europeus e não na maioria dos outros países espalhados pelo mundo.
Não há defesa razoável que sustente ações terroristas. O terror empregado contra pessoas – porque geralmente o terror não é contra o país, mas sim contra cidadãos de determinado país –  é um crime que deve ser combatido permanentemente. Entender as motivações que levam pessoas a se agruparem em torno de movimentos radicais é um passo importante para combater esse tipo de violência.
Infelizmente para os cidadãos norte-americanos, a compreensão do terrorismo é um dos últimos objetivos dos Estados Unidos. As atitudes tipicamente imperialistas do país tem gerado e espalhado muito ódio em todo o planeta, o que acaba gerando movimentos radicais que, por sua vez, retribuem com ações terroristas.
Pelo menos dessa vez estamos assistindo a uma cautela maior por parte do governo e da mídia dos Estados Unidos em não se adiantarem às investigações. Até agora as autoridades não apontaram o dedo para essa ou aquela organização, para essa ou aquela pessoa como responsável pelo atentado. Em tempos tão difíceis, pode-se considerar que já é um avanço.




* Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com

Guerra Cibernética


Uma ameaça um tanto silenciosa paira sobre o mundo. Trata-se da chamada “guerra cibernética”, uma consequência direta da integração mundial de redes de computadores que estão conectados vinte e quatro horas por dia, possibilitando um amplo leque de opções para atividades inescrupulosas, tanto no campo empresarial como para ataques contra alvos estatais.
Embora a “guerra cibernética” esteja ainda longe de ser uma realidade disseminada, ela existe e temos exemplos concretos de ataques relativamente bem sucedidos que, apesar de limitados, causaram prejuízo àqueles que foram alvo dessas ações.
Um exemplo muito citado por especialistas da área e que demonstrou o potencial de um ciberataque coordenado, ocorreu contra a Estônia, em 2007. Na ocasião, o país praticamente “saiu do ar” com a indisponibilidade da sua rede virtual, prenunciando uma espécie de colapso de nossas sociedades cada vez mais dependentes das tecnologias da informação.
Mais recente foi o ataque sofrido pelo Irã, quando inimigos (supostamente os governos norte-americano e israelense) conseguiram contaminar parcialmente o seu programa nuclear com o agora famoso vírus “Stuxnet”. Estima-se que a ação desse vírus foi capaz de atrasar em vários meses o programa nuclear iraniano, causando também considerável prejuízo financeiro.
Por suas características intrínsecas a guerra cibernética contem um enorme potencial para se tornar cada vez mais ameaçadora e perigosa. À medida que aumentamos nossa dependência com relação a sistemas computadorizados conectados em redes permanentes, nos tornamos mais e mais vulneráveis, tanto governos quanto sociedades.
É um perigo que o público em geral conhece parcialmente, ou seja, se torna motivo de atenção e preocupação apenas quando contas bancárias ou dados da vida privada são roubados ou “capturados” pela internet e que provocam danos materiais ou para a imagem da pessoa.
Mas, na verdade, o problema é muito mais sério, uma vez que afeta a segurança da coletividade, do Estado, da nação como um todo. Não é à toa que os países mais desenvolvidos vem, já há algum tempo, dando a devida atenção para o fenômeno e realizando “experimentos” que podem ter sérias consequências internacionais. Os ciberataques citados contra a Estônia e contra o Irã seguramente não foram realizados por hackers ou organizações criminosas comuns.
A rigor, a única forma de diminuir a vulnerabilidade diante dessa ameaça é desenvolver de forma consistente uma efetiva e complexa capacidade de defesa que exige alto investimento no desenvolvimento científico e tecnológico, o que só pode ser conseguido a partir de uma visão estratégica no plano do Estado.
No Brasil, as nossas Forças Armadas estão, de acordo como os recursos disponíveis, se preparando para o futuro que já chegou e que está devidamente incorporado à Estratégia Nacional de Defesa. Dentre as Forças, sabe-se mais sobre as atividades do Exército, que em Brasília conta com Centro de Comunicações e Guerra Eletrônica do Exército (CCOMGEX).  De toda maneira, há ainda muito a ser feito nesse campo, decisivo para a segurança e o futuro de todos nós.


Os BRICS na África


Pio Penna Filho*

Os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) se reuniram em Durban, África do Sul, para mais um encontro de cúpula. Essa foi a quinta cúpula e um dos assuntos mais importantes girou em torno crise econômica internacional. Outros temas, além dos tradicionais (promoção do desenvolvimento inclusivo e sustentável, reforma da governança global, segurança e estabilidade mundial) também foram contemplados, como a colaboração em setores da segurança informativa, combate ao tráfico de drogas e financiamento de projetos de infraestrutura em países africanos.
Os países membros do Brics continuam se destacando na economia internacional. A média de crescimento dos cinco membros foi, em 2012, de 4%, o que significa que suas economias, tomadas em conjunto, cresceram cinco vezes mais que o grupo do G7 (Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha, Japão, Canadá e Itália). Além disso, o grupo foi responsável por 21% do Produto Interno Bruto mundial, o que não é pouco.
A decisão que ganhou maior divulgação na mídia foi a da criação do Banco de Desenvolvimento do Brics. A ideia é que a nova instituição possa promover projetos de desenvolvimento que atendam as expectativas dos países membros, atuando em paralelo a outras instituições como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.
Ainda não há consenso absoluto em torno de como estruturar o Banco e qual o valor total do seu capital, que está estimado, por enquanto, em 50 bilhões de dólares. Pelo que foi divulgado, a Rússia é o país que está destoando do grupo nesse assunto, embora a sua delegação tenha enfatizado ser favorável à criação da nova instituição.
Outro assunto que merece destaque foi a decisão dos países membros de investirem mais no continente africano. Para a África do Sul e para os demais países africanos, essa é um notícia alvissareira. Se, de fato, os Brics ampliarem os investimentos na África isso poderá levar a uma expansão da infraestrutura em partes do continente africano e a ampliação do seus fluxos comerciais com outros países.
Apesar dos benefícios para a África que serão proporcionados pelos novos investimentos que virão, é preciso que os dirigentes africanos reflitam e pesem os prós e contras dessas futuras inversões. O problema, nesse caso, reside no fato de que se esses investimentos tiverem o único objetivo de explorar os recursos naturais africanos, eles não significarão nada de novo quando comparados com os investimentos predatórios das antigas metrópoles coloniais. Assim, os africanos tem um dilema pela frente.
Num balanço geral dessa última cúpula registram-se avanços políticos notáveis, sendo o mais importante a decisão da criação do Banco de Desenvolvimento, que aliás já vinha sendo discutida desde o ano passado.
Essa é uma boa ideia que, se vingar, poderá ajudar os países emergentes em seus projetos de desenvolvimento, dotando-os de um mecanismo independente dos tradicionais Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional, ainda hoje controlados de forma um tanto desproporcional pelos países desenvolvidos.


* Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com

Outono Árabe


Pio Penna Filho*

Os países que estiveram na linha de frente da chamada “Primavera Árabe” (Egito, Líbia e Tunísia), ocorrida no início de 2011, estão agora atravessando um verdadeiro “Outono Árabe”, com sérios problemas políticos que beiram o estado de guerra civil.
Embora pouco se fale da Líbia pós Muammar Kadaffi, o país está longe de ter migrado de um regime despótico para uma democracia ao estilo ocidental. Não há consenso político, seja em torno de uma liderança, seja de um movimento, que promova a união dos líbios. Ademais, o Estado vive à mercê de grupos armados que ostentam abertamente o seu poder de fogo para fazer valer as mais variadas pretensões políticas. Por enquanto, manda quem tem mais força e apoio das potências europeias que, diga-se de passagem, estão aproveitando muito bem a ocasião para explorar o petróleo do país.
O Egito está constantemente nas manchetes dos jornais do mundo inteiro e o governo do presidente Mohamed Mursi, que queria virar faraó, vem sendo mantido sob intensa pressão por parte expressiva da população egípcia que não se desmobilizou com a queda do ex-ditador Hosni Mubarak. Aliás, os militares do país chegaram a ameaçar intervir na vida política caso os desentendimentos entre a oposição e governo (Irmandade Muçulmana) persistam e se disseminem a ponto de levar a uma ruptura social e a guerra civil ao país.
Agora parece ter chegado a vez da Tunísia, que até bem pouco tempo atrás era usada como exemplo de estabilidade pelos adeptos da tese de que a “Primavera Árabe” iria levar a democracia e as instituições liberais do chamado “Ocidente” para o mundo árabe. Simples assim.
O assassinato do líder oposicionista Chukri Bel Aid foi uma espécie de gota d’água que reacendeu os ânimos dos manifestantes, levando-os de volta aos violentos protestos em Túnis, que passaram a polarizar islamistas e secularistas. Por ora, é impossível prever o que irá acontecer com o país.
As coisas não estão saindo exatamente como esperado pelos otimistas defensores da exportação da democracia para o mundo árabe, que para eles teria o poder de resolver todos os problemas e dramas que afligem as populações que professam o Islã ou que vivem em países de maioria muçulmana.
Uma parcela importante da população que vive sob a égide do Islã não faz e não quer fazer a separação entre política e religião, como ocorreu nos países europeus e naqueles que nasceram sob inspiração da filosofia política da Europa da Idade Moderna. Muitas pessoas simplesmente não veem vantagens em aderir de peito aberto a um tipo de sociedade que preza o consumo e o individualismo acima de tudo. Assim, estamos diante de mundos que prezam valores que se diferem profundamente.
No fundo, o Ocidente (leia-se Europa e Estados Unidos) não compreende o mundo árabe, ou melhor, o mundo muçulmano. Mas, pior do que isso, acha-se superior em tudo, no estilo de vida, no modelo político e nos valores morais que fundamentam as sua sociedades.
No caso dos árabes, eles certamente um dia terão a sua “Primavera” consagrada. Mas, aparentemente, isso só será possível quando o “Ocidente” intervir menos e respeitar mais o direito à autodeterminação dos outros, seja dos árabes, dos africanos, dos latino-americanos, dos asiáticos, enfim, de todos os não-Ocidentais.




* Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CNPq. E-mail: piopenna@gmail.com